O que a Amazônia tem a ver com a escuridão em São Paulo?
No dia 19 de agosto de 2019, São Paulo foi invadida por uma “escuridão” sem explicação. Especialistas tentavam entender como o entardecer da cidade poderia ter se tornado noite de forma tão rápida. No entanto, meteorologistas confirmaram que, além de uma frente fria oriunda de ventos marítimos vindos do sul que estavam se aproximando de São Paulo, fuligem e cinzas do desmatamento ocasionado na Amazônia também eram os responsáveis por essa escuridão fora de hora.
A corrente de ar que veio da Amazônia trouxe consigo uma grande nuvem de fumaça que afetou as regiões centro-oeste, o sudeste e o sul do Brasil, e outros países como como Argentina, Uruguai, Peru e Bolívia. Incêndios ocorridos na fronteira entre Bolívia e Paraguai também contribuíram bastante para que o evento se tornasse ainda mais intenso.
Especialistas já vinham alertando para o fenômeno. Um pesquisador argentino a serviço da NASA afirmou ao site UOL que “Incêndios sempre acontecem nesta época do ano. Mas o corredor da fumaça não se forma todos os anos por razões que incluem o número de incêndios e sua intensidade, o tipo de combustível, a umidade no solo e questões meteorológicas”. Além disso, no dia 18 de agosto de 2019, uma fotografia foi publicada de uma lua alaranjada, na região de Livramento, fronteira entre Brasil e Uruguai. Essa tonalidade era causada por um efeito óptico ocasionado pelas partículas de poluição presentes na atmosfera vindas dos incêndios no norte do país.

A fumaça que está em concentrações mais altas que a dos últimos anos contribui para a piora da qualidade do ar, o que oferece riscos à saúde, sobretudo, de idosos e crianças.
De acordo com Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE), o Brasil vive a maior onda de queimadas em relação aos último cinco anos. Dados divulgados pelo site El País, as queimadas aumentaram em 82% em comparação ao primeiro semestre de 2018. Da mesma maneira, de acordo com o site da BBC, o desmatamento em unidades de conservação da região da bacia do rio Xingu cresceu 44,7% entre o período de maio a junho de 2019. Esses dados revelam uma tendência de crescimento no desflorestamento da Amazônia, e um aumento na pressão sobre esse bioma.
Pesquisadores da Universidade de Oklahoma constataram que a Amazônia brasileira perdeu mais de uma Alemanha em área florestal entre os períodos de 2000 a 2017. O resultado é mais que o dobro apontado pelo INPE. Essa discrepância ocorreu possivelmente devido à metodologia aplicada, como a análise de imagens de satélite com menos interferência de nuvens e sombras. Assim, o desmatamento é muito mais alarmante do que se imaginava.

Incentivados pelas declarações do Presidente Jair Bolsonaro e do ministro Ricardo Salles (ministro do Meio Ambiente), fazendeiros do sudoeste do Pará instituíram o “dia do fogo”, o que foi confirmado pelo INPE que registrou uma explosão de focos de incêndio na região. Houve um aumento de 300% no número de registros de fogo na área. As fiscalizações na região foram canceladas depois que a PM estadual e a Força Nacional (ligada ao Ministério da Justiça) deixaram de apoiar as ações do IBAMA, que ainda sofre com falta de recursos e pessoal na região.
É importante ressaltar que a mesma corrente de ar que trouxe a coluna de fumaça que tem se espalhado pelo sudeste é a responsável por trazer os “Rios Voadores”. Essa massa de ar (ou curso d’água atmosférico) que vem da Amazônia é responsável por trazer umidade que irá formar toda a chuva que abastece de água o Pantanal mato-grossense e também os estados do sul e sudeste. Ou seja, se continuarmos a destruir e a queimar a floresta que é nossa fonte de chuva, há uma grande probabilidade de transformarmos o sul e o sudeste do país em um deserto, prejudicando a produção agropecuária, produção de energia e o abastecimento de água. Fome e sede é o que nos aguarda no futuro se nada for feito.

Os problemas ambientais brasileiros têm se agravado ano após ano. A Caatinga, por exemplo, já sofre com processos de desertificação que atingem 12,85% do seu território. A Mata Atlântica só possui cerca de 12% de sua área original, e apesar de terem diminuído o ritmo, os desmatamentos ainda ocorrem nesse bioma. O Cerrado, o Pampa e o Pantanal também tem sofrido do mesmo problema. O que será do nosso futuro se não pressionarmos os políticos para cumprir a nossa Consituição?
De acordo com o artigo 225 da Constituição Brasileira: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”
No entanto, em entrevista concedida à BBC News Brasil, o atual ministro do meio ambiente, Ricardo Salles, disse que a Amazônia precisa de soluções capitalistas para ser preservada. Além disso, o ministro criticou a demarcação de áreas indígenas e a criação de áreas de conservação.
Atualmente, o Brasil se encontra na contramão dos dados científicos. A preservação da Amazônia, assim como a preocupação com esse bioma, é unanimidade entre todos os pesquisadores. A preservação precisa ir além de questões ideológicas. Necessita ser tomada a sério por todos. Caso contrário, as mudanças climáticas serão ainda mais evidentes.
REFERÊNCIAS
Betim Felipe. Incêndios se alastram pelas matas do Norte e Centro-Oeste e já podem ser sentidos até no céu de São Paulo. (https://brasil.elpais.com/brasil/2019/08/19/politica/1566248656_245830.html). Visitado dia 20/08/2019.
Fellet João. Desmatamento dispara no Xingu, um dos principais ‘escudos’ da Amazônia. (https://www.bbc.com/portuguese/brasil-49200825). Visitado dia 20/08/2019.
Potter Hyury. Desmatamento na Amazônia seria o dobro do registrado pelo INPE, aponta estudo de universidade americana. (https://www.bbc.com/portuguese/brasil-49402606). Visitado dia 20/08/2019. Schreiber Mariana e Fellet João. Amazônia precisa de ‘soluções capitalistas’, diz ministro do Meio Ambiente. (https://www.bbc.com/portuguese/brasil-49363387). Visitado dia 20/08/2019.