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Eureka Entrevista: a Física Médica

Ninguém sabe tudo, mas sempre tem alguém que sabe o que você quer saber. Procure esse alguém e pergunte.

O Eureka Brasil procurou dois físicos para entender melhor sobre o que é Física Médica.

Dra. Ana Carolina Bruno Machado
Prof. Dr. Ricardo Andrade Terini

Fizemos uma entrevista com Ricardo Andrade Terini, doutor em Física Nuclear Experimental pela Pontifícia Universidade Católica em São Paulo (PUC-SP) e professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP), e com Ana Carolina Bruno Machado, doutora em Física Teórica pelo Instituto de Física Teórica da Universidade Estadual de São Paulo (UNESP) e pós-doutoranda na Universidade Cruzeiro do Sul de São Paulo.

Esses dois físicos brasileiros se juntaram para escrever um livro sobre a Física Médica. A Física Médica é  uma área muito interessante da física que é diretamente aplicada na medicina. Desde já agradecemos a disponibilidade para a entrevista e para compartilhar o conhecimento.

 

1) Como você se interessou pela área de Física Médica?

Ricardo: Eu era professor do Departamento de Física da PUC-SP, já há vários anos, e, no final dos anos 1990, fechamos um acordo de cooperação acadêmica com o Instituto de Energia e Ambiente da USP (IEE-USP), para fazermos pesquisas e orientarmos alunos da PUC-SP em projetos de Iniciação Científica sobre detecção de raios X em colaboração com eles. Foi ali que travei conhecimento com pesquisadores da área de Física Médica e me interessei pelo assunto. Percebi a carência no país de físicos com formação nessa área tão importante e me empenhei em colaborar com isso na PUC-SP. Em pouco tempo, numa comissão de professores, alteramos o projeto pedagógico do curso de Física e o transformamos, em 1998, num curso de Bacharelado em Física com ênfase em Física Médica, o 2º do país, na época. O curso funcionou até 2014. Hoje, há mais de dez cursos de graduação nessa área. E fico feliz de saber que muitos de meus ex-alunos estão atuando com sucesso nessa área tão importante.

 

Ana: Eu queria fazer medicina na área de oncologia, prestei o vestibular para medicina e como a grande maioria da humanidade, não passei na primeira tentativa, e minha mãe me inscreveu no curso de física médica na PUC nas vagas remanescentes, com a nota do vestibular para medicina. E aí me apaixonei por Física. Fiz iniciação científica com o Ricardo, que foi meu primeiro orientador, na área de Física Médica por três anos. Resolvi, então, que queria conhecer uma área nova e fui fazer o mestrado em Física Teórica. Sempre acreditei que temos que divulgar a pesquisa básica e apresentar para a comunidade o retorno que a pesquisa nos dá. Isso deve acontecer mesmo que não seja algo previsto desde o início. Por isso sempre continuei interessada na área de Física Médica que é uma aplicação muito bonita e relevante para a sociedade da Física de partículas. Para as demais questões o Ricardo é o especialista da área e eu só posso dizer que assino embaixo de tudo o que ele fala nessa entrevista.

 

2) O que é Física Médica e o que faz o professional especialista nesta área?

Ricardo: A Física Médica é uma área da Física aplicada. Desde 2012, ela foi classificada pela OIT como “parte integrante da força de trabalho dos profissionais da área da Saúde”. Hoje em dia, ela ocupa-se da viabilização e otimização das técnicas e processos clínicos de Diagnóstico por Imagens, Radioterapia e Medicina Nuclear. A Física Médica tem caráter interdisciplinar e cada tecnologia foi, e é derivada, da aplicação de conhecimentos de todas as áreas da Física, desde a Mecânica Newtoniana até a Física contemporânea. O Físico médico é um membro da equipe multidisciplinar envolvida no diagnóstico e tratamento de pacientes com radiação ionizante e não ionizante. Além disso, ele ajuda a garantir um elevado padrão de qualidade de serviço em hospitais e clínicas. Na prática ele irá atuar de forma conjunta e harmônica com especialistas de outras áreas, tais como farmacêuticos, médicos, enfermeiros, biólogos, tecnólogos, engenheiros e administradores. Suas atividades podem envolver: pesquisa, desenvolvimento e ensino, treinamento, colaboração no planejamento em radioterapia, testes de controle de qualidade de equipamentos emissores de radiação e processos correlatos, calibração de dosímetros, proteção radiológica de pacientes e trabalhadores, entre outras.

 

3) Como o conhecimento científico da Física-Médica pode ajudar a sociedade?

Ricardo: A tecnologia médica é essencial para a medicina moderna e a demanda por físicos médicos e engenheiros biomédicos qualificados tem aumentado rapidamente em todo o mundo, em função de sua formação específica e da crescente complexidade dos equipamentos e técnicas utilizadas no diagnóstico e na terapia médicas. Outro motivo é o número crescente de novos centros diagnósticos e terapêuticos, bem como de novos equipamentos instalados no país. Não há outro profissional, hoje, com formação adequada para atuar na garantia de qualidade dos processos clínicos de diagnóstico por imagens e de terapia com radiações. É importante e estratégico para o país que mais jovens tomem contato e se estimulem a fazer carreira neste instigante campo de aplicação do conhecimento, para que possamos fazer frente às demandas atuais.

 

4) Quais são os tópicos mais quentes de pesquisa científica nessa área? E quem são os cientistas trabalhando para resolver essas perguntas?

Ricardo: Em vários países, mas em particular nos Estados Unidos e alguns países da Europa e Ásia, além do Brasil, a pesquisa e o desenvolvimento na área é bastante intensa, visando, por exemplo: métodos híbridos de diagnóstico por imagem cada vez mais precisos e confortáveis para o paciente (por exemplo, o PET-CT, o PET-RM, a Tomossíntese e o CT de mamas); métodos terapêuticos em oncologia em que a radiação atinja o tecido dos tumores o mais rapidamente possível, afetando o menos possível os tecidos saudáveis das vizinhanças dos tumores (por exemplo, o IMRT, o IGRT, e a terapia com feixes de prótons); o controle do histórico pessoal das doses de radiação recebidas pelos pacientes, independente do local. No Instituto de Física da USP, temos o Grupo de Dosimetria das Radiações e Física Médica trabalhando nesse sentido, em particular nos campos do Radiodiagnóstico, da Dosimetria e da Proteção Radiológica.

 

5) Como surgiu a ideia do livro “Uma Introdução à Física Médica – da Antiguidade Aos Tempos Atuais”?

Ricardo: Foi, antes de tudo, um feliz encontro dos desejos, meu e da Ana Carolina, de compartilhar conhecimentos sobre a Física básica e a Física Médica. A motivação do livro foi, inicialmente, a percepção do desconhecimento, por parte da maioria dos estudantes secundários brasileiros, sobre os campos de aplicação da Física, e, em particular, da Física Médica. Isso, justamente quando cresceu o número de cursos de Bacharelado em Fí­sica Médica (ou Fí­sica com Ênfase/habilitação em Física Médica), e o número de vagas para cursos de Residência profissional e pós-graduação na Área, tanto quanto de postos profissionais para físicos médicos. Uma das grandes dificuldades no ensino e aprendizagem da Física é justamente a falta de percepção da utilidade de seus conceitos e de suas possí­veis aplicações. Isso, muitas vezes, desmotiva muitos jovens a ter um contato mais profundo com essa ciência. Por isso, o livro foi pensado inicialmente para aqueles alunos em fase de escolha de carreira acadêmica no Ensino Médio, ou de início do Ensino Superior nas áreas de Exatas e Saúde. A ideia é que os exemplos descritos no livro sejam um incentivo ao aprendizado da Fí­sica e de sua aplicação à Medicina, a Fí­sica Médica, de influência tão cotidiana e profunda para o público em geral. Outro objetivo foi contribuir para uma melhor caracterização da área para o público em geral. Criamos, inclusive, uma página no Facebook para permitir a interação entre os leitores, professores e pesquisadores que se interessem em utilizar o livro. E também para permitir trocas de informação, de experiências e atualização.

O link para a página é https://www.facebook.com/introducaoafisicamedica/

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