Belo Monte: desenvolvimento econômico e degradação ambiental
A construção da usina hidrelétrica de Belo Monte foi e continua sendo alvo de inúmeras críticas. Apesar de dela ser a terceira maior hidrelétrica do mundo, muitos analistas ainda criticam a construção da usina. Para começo de conversa, a usina de Belo Monte começou a ser construída em 2010, nas cidades de Altamira, Vitória do Xingu e Senador José Porfírio, no estado do Pará, Amazônia Brasileira. Com o término da sua construção, estima-se que a usina será capaz de gerar mais de 11000 MW/hora. Contudo, a construção da usina continuou sendo alvo de críticas, apesar da sua imponência no quesito energia. E por que os analistas criticam Belo Monte? A construção da usina não tem pontos positivos também?
Obviamente, os pontos positivos da construção da usina estão no fato da grande geração de energia. É evidente a relação entre energia elétrica e desenvolvimento socioeconômico. O acesso à energia elétrica induz e conduz a um maior desenvolvimento econômico e promove o bem-estar social. O acesso a formas modernas e eficientes de energia é um indicador das condições de vida de uma população. O simples fato de poder ter uma geladeira para armazenar a comida, ou um fogão para prepará-la, já conduz a uma mudança substancial de como a população trata a comida. Agora, pode-se fazer mais comida, pois se tem onde guardar; podem-se utilizar outros temperos, pois a comida não irá estragar. Esse pensamento parece uma besteira, mas, para aquele que não usufruía de tal “regalia”, esse pensamento tem um valor incomensurável.
A declaração de um empresário, situado em Altamira, no ano de 2011, reflete muito bem esse pensamento: “Se for para resumir numa frase só, eu vejo Belo Monte como uma possibilidade de desenvolvimento pra região. E pra todos aqui. Além do mais, o país precisa de energia”.
Contudo, toda a “regalia” gera uma inconveniência. Muitos protestos de movimentos sociais e povos indígenas cercam a construção da usina, justamente devido ao seu maior problema: a degradação ambiental. A hidrelétrica de Belo Monte ficou conhecida pela ameaça que representa aos povos indígenas por tornar mais fácil a construção de uma série de represas planejadas rio acima, em áreas indígenas. A declaração da liderança indígena Juruna, situada em Volta Grande do Xingu, em 2011, expressa a crítica e a ameaça aos indígenas: “Nosso povo precisa sobreviver, nosso povo precisa desenvolvimento sustentável, aprender a produzir e a cuidar daquilo que é nosso. Estamos lutando não contra o desenvolvimento, mas pelo nosso planeta, pelo mundo”.
Não só os indígenas estão ameaçados com a construção da usina. A fauna e a flora também estão em risco. Várias áreas florestais serão alagadas para o desenvolvimento de represas que servirão como base para a geração de energia. Em estudos desenvolvidos por Cunha e Ferreira (2012), observa-se que as formações florestais pioneiras sofreram uma queda de 21%, enquanto que as formações florestais densas caíram 68,7%, mantendo-se intacta apenas 10,3% da vegetação nativa, constatando a diminuição da diversidade vegetal. Contudo, com a diminuição dessa diversidade, o regime de chuvas, assim como a composição do solo também serão alteradas.
Existe ainda uma dúvida quanto à quantidade de energia produzida pela hidrelétrica. Estudos científicos indicam que, apesar da propaganda de que 11000 MW de energia serão gerados, a maioria dessa energia será gerada no período úmido, sem a capacidade de estocagem de água excedente, gerando pouca energia no período seco. Isso ocorre porque os rios da Amazônia são de planície, não havendo condições de se construir reservatórios de grandes dimensões. Além disso, os rios de planície não apresentam quedas d’água significativas, ocorrendo somente no período das cheias, o que acarretaria em uma diminuição da geração de energia nos períodos de seca.
Ademais, vários estudos realizados por Fearnside apontaram a emissão de gases do efeito estufa por parte da hidrelétrica. Outros estudos, realizados por Forster e colaboradores apontam, ainda, que a hidrelétrica poderia emitir metano, um gás de efeito estufa com 25 vezes mais impacto sobre o aquecimento global. Esse impacto resulta, simplesmente, da água que passa pelas turbinas e vertedouros da usina. De maneira bem simplificada, essa água é retirada da profundidade dos reservatórios, onde contém uma alta concentração de metano dissolvido. Quando a pressão da água é diminuída ao sair das turbinas, esse metano é liberado para a atmosfera.
Resumindo tudo isso: a energia produzida pela usina (parte positiva) irá contar com alguns agravantes ao meio ambiente, como a destruição de parte da fauna e da flora, com queda na biodiversidade; e com o aumento da emissão dos gases do efeito estufa, principalmente metano (partes negativas). Desse modo, nos restam algumas perguntas:
- Vale ou valeu a pena construir a usina?
- Existem formas alternativas para a geração de energia?
A resposta da primeira pergunta é: depende. Economistas diriam que sim, valeu a pena, pois o investimento foi relativamente baixo. Além além disso, irá gerar energia para comunidades que não dispunham de tal benefício, melhorando a qualidade de vida dessas populações. Para ambientalistas e sociólogos, a construção da usina será péssima, pois irá alagar terras indígenas e regiões de mata virgem, nunca antes exploradas.
Com relação à segunda pergunta, a resposta é: sim. Existem várias alternativas para a geração de energia, principalmente através das fontes renováveis e alternativas de energia, contudo, essas fontes (como a eólica) geram uma redução na produção de energia, além de maiores custos e tecnologia para serem implantadas.
Assim, cabe mais uma pergunta, que ficou obscura durante todo esse texto: O que queremos para o mundo? Sábias foram as palavras do militante dos direitos humanos que, em 2011, fez a seguinte declaração: “É o modelo de desenvolvimento que está em disputa. É o que a gente quer também do futuro do Brasil. Porque tá no campo do simbólico Belo Monte. Quem vai vencer a forma de organizar a Amazônia? Quem vai vencer o que eu quero pra esse país, qual é o futuro, o que a gente quer?”.
REFERÊNCIAS
Castro, N. J.; Leite, A. L. S.; Dantas, G. A. Análise comparativa entre Belo Monte e empreendimentos alternativos: impactos ambientais e competitividade econômica. GESEL, 2011.
Cunha, D. A.; Ferreira, L. V. Impacts of the Belo Monte hydroelectric dam construction on pioneer vegetation formations along the Xingu River, Pará State, Brazil. Brazilian Journal of Botany, 2012.
Fearnside, P. M. Hydroelectric dams in the Brazilian Amazon as sources of ‘greenhouse’ gases. Environmental Conservation, 1995.
Fearnside, P. M. Greenhouse gas emissions from a hydroelectric reservoir (Brazil’s Tucuruí Dam) and the energy policy implications. Water, Air and Soil Pollution, 2002.
Fearnside, P. M. Brazil’s Samuel Dam: Lessons for hydroelectric development policy and the environment in Amazonia. Environmental Management, 2005a.
Fearnside, P. M. Do hydroelectric dams mitigate global warming? The case of Brazil’s Curuá-Una Dam. Mitigation and Adaptation Strategies for Global Change, 2005b.
Fearnside, P. M. As hidrelétricas de Belo Monte e Altamira (Babaquara) como fontes de gases de efeito estufa. Novos Cadernos NAEA, 2009.
Fearnside, P. M. Gases de Efeito Estufa no EIA-RIMA da Hidrelétrica de Belo Monte. Novos Cadernos NAEA, 2011.
Fleury, L. C.; Almeida, J. A construção da usina hidrelétrica de belo monte: conflito ambiental e o dilema do desenvolvimento. Ambiente & Sociedade, 2013.
Forster, P. et al. Changes in atmospheric constituents and radiative forcing. Cambridge University Press, 2007.