Amamentação: de onde vem o leite materno?
Todo ano, em agosto, ocorre a Semana Mundial do Aleitamento Materno . Em 2017, aconteceu a 25a edição do evento. Nesta data, o governo brasileiro instituiu o Agosto Dourado: o mês do aleitamento materno. Muito mais do que uma semana, agora o mês de agosto inteiro é dedicado à informação e ao debate da importância do alimento de ouro: o leite materno!
Sim, eu sei que não estamos em agosto. Mas todos os dias nascem bebês. E, com eles, nascem mamães. Mamães que, muitas vezes, não tem noção do que vem pela frente quando o assunto é amamentação. Porque amamentar é natural, mas nem sempre é fácil!
Muitas mamães passam por dificuldades por não saberem como a lactação se estabelece. Algumas dificuldades são tão significativas que resultam no término prematuro da amamentação. Por isso, o assunto é sempre pertinente. No post de hoje vou esclarecer algumas questões que toda nova mamãe – e todo novo papai também – deve saber sobre o aleitamento!
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) e as Academias de Pediatria, a alimentação dos bebês deve ser exclusivamente de leite materno até os seis meses de vida. Essa é a primeira e mais importante questão!
E por que só leite materno?
O leite materno contém uma diversidade de componentes. Proteínas, lipídeos, açúcares e carboidratos, que proveem energia; vitaminas A, E, B1, B2, B6, B12, D; e diversos micronutrientes, como selênio, iodo, cálcio, ferro, zinco, cobre. Logo, toda a demanda nutricional do bebê é provida pelo leite.
Além disso, o leite materno contém um verdadeiro coquetel de anticorpos, que ajudam a proteger o bebê contra diversas doenças infecciosas, como gastroenterite e pneumonia. Neste momento da vida, o sistema imunológico do bebê ainda está em formação. Por isso, o bebê é muito suscetível a contrair estas doenças.
E o melhor de tudo: todos esses benefícios são de graça!
De onde vem o leite?
O leite é produzido pelas glândulas mamárias. Estas glândulas são tão importantes, a ponto de serem a base para a classificação de um grupo específico de animais: os mamíferos!
Estas glândulas começam a ser formadas quando a futura mamãe ainda é um bebê, no útero. Ao nascimento, a estrutura dessas glândulas ainda é rudimentar. Ou seja, é apenas um “projeto em andamento”. Quando a menina atinge a puberdade, estes protótipos das glândulas mamárias começam a se desenvolver em resposta aos hormônios. E começam a se ramificar em meio a um tecido adiposo.
A estrutura final fica parecida com uma árvore, com vários ramos. Na ponta destes ramos, duas camadas de células formam uma estrutura tridimensional que lembra um saco, ou uma bexiga de festa. O espaço vazio no interior desses saquinhos forma um pequeno tubo coletor. Esse tubo, tecnicamente chamado de lúmen, se conecta a diversos outros, formando um ramo de maior calibre.
Veja o esquema abaixo:
As células internas, que estão em contato direto com o lúmen, são as células alveolares, produtoras do leite. E recobrindo externamente esta camada de células alveolares, estão as células mioepiteliais. Estas células são parecidas com as células musculares. São capazes de realizar movimentos de contração.
Quando a mulher não está grávida, estas glândulas permanecem dormentes e não produzem leite. Porém, logo no início da gravidez, os hormônios estrogênio, progesterona, prolactina e lactogênio placentário iniciam o processo de transição das glândulas para o estado secretor. Primeiramente, uma extensa proliferação das células alveolares ocorre. Além disso, os altos níveis de prolactina induzem a diferenciação de células-tronco (sim, elas também estão envolvidas nisso!!!) em mais células alveolares. Dessa forma, a glândula aumenta rapidamente de tamanho. No entanto, durante a gravidez, não há produção de leite, que é bloqueada pelas altas concentrações de progesterona.
Após o parto, a progesterona cai e as células alveolares iniciam a produção e secreção do leite para o lúmen da glândula. O primeiro fluido produzido é o colostro. Sua produção, no entanto, não é imediata. Ao contrário, demora cerca de 30-40h após o parto. E somente um pequeno volume é produzido. Algo em torno de 30ml a cada 24h. O colostro contém um alto teor de anticorpos e uma baixa concentração de lactose, o principal açúcar presente no leite. Por isso, sua função principal é imunológica e não nutricional.
Quer dizer que o leite é produzido somente depois que o bebê nasce?
Exatamente!
Como já mencionado, a queda da progesterona após o parto permite que as células alveolares comecem a produzir o colostro. O segundo passo envolve a liberação de um outro hormônio: a oxitocina. Este hormônio, liberado pela glândula pituitária, provoca a “descida do leite”, que é tecnicamente chamada de reflexo de ejeção do leite.
Quando o bebê suga o mamilo, a oxitocina é liberada. A sucção ocasiona a contração das células mioepiteliais, movendo o leite em direção ao mamilo, através dos ductos. Quanto mais cedo a sucção ocorrer, mais rapidamente o leite começa a ser produzido. É por isso que pediatras recomendam que o bebê seja colocado no colo da mãe imediatamente após o nascimento. Quando isto é feito, os bebês têm a habilidade de achar o seio e realizar a pega. A sucção espontânea do seio ocorre entre 20-30 minutos após o parto na maioria dos bebês.
O que fazer para que a produção de leite seja mantida?
Os principais estímulos para a manutenção da produção de leite são a sucção do mamilo pelo bebê e o esvaziamento da mama . Por isto dizemos que a produção ocorre sob demanda.
Quando a mama está cheia, uma proteína bloqueia a produção e a secreção de leite. Essa proteína, chamada feedback inhibitor of lactation (FIL, em tradução livre, “inibidor de lactação por retorno”), é produzida pelas próprias células produtoras do leite e adicionada a ele. Dessa forma, quando o leite permanece na glândula, a FIL é reconhecida pelas células alveolares, fazendo com que elas parem de produzir mais leite. Logo, se a mama não for esvaziada, não haverá produção.
É o que acontece no desmame. Como os estímulos cessam, a produção de leite diminui e as células alveolares começam a morrer. Este processo é denominado involução. Assim, a glândula retorna ao estado de dormência do período pré-gravidez.
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Respondidas todas estas perguntas, a mensagem final é: estabelecer a amamentação pode sim ser difícil inicialmente. Mas tudo pode ser vencido com calma e paciência. Em sua grande maioria, uma vez que a lactação seja iniciada, a mamãe é capaz de produzir leite suficiente para suprir a demanda nutricional do bebê.
E não existe leite fraco! Maaas, estresse mental e físico podem reduzir a liberação de oxitocina, o que pode prejudicar a ejeção do leite.
Portanto, mamães, descansem o quanto for possível, deixem o bebê sugar o maior tempo possível, esvaziem as mamas, trabalhem para promover a pega correta e, no mais, curtam a nova fase e deixem a natureza agir! E claro, procurem orientação médica!
REFERÊNCIAS
Inman J, Robertson C, Mott J, et al. Mammary gland development: cell fate specification, stem cells and the microenvironment. Development. 2015.
Lee S, Kelleher S. Biological underpinnings of breastfeeding challenges: the role of genetics, diet, and environment on lactation physiology. American Journal of Physiology, Endocrinology and Metabolism. 2016.
Bergmann R, Bergmann K, von Weizsäcker K, et al. Breastfeeding is natural but not always easy: intervention for common medical problems of breastfeeding mothers – a review of the scientific evidence. Journal of Perinatal Medicine. 2014.